É muito engraçado como a vida acaba nos levando por mares nunca dantes navegados e, por mais que a gente tente não consegue escapar de suas garras.
Há muito eu desisti de remar contra a maré e, quando sinto que a correnteza é muito forte deixo o meu barco à deriva.
Foi assim que vim parar no peculiar bairro de Guaratiba, na cidade do Rio de Janeiro. Aqui tudo é muito diferente do que estava acostumada. O local é estranho, tem ares de cidade pequena, as pessoas têm uma maneira de falar completamente diferente dos grandes centros urbanos. Ninguém tem pressa, o tempo parece passar preguiçoso e acabei ficando meio preguiçosa também. Plantei árvores frutíferas, esperei crescerem, tive sonhos, esperei e deixei me envolver por um clima de “paz e amor”.
Mas tudo que é muito bom também dura muito pouco, a ilusão local se transformou em um grande pesadelo.
Falando um pouco sobre o local
Ao receber a herança do meu sogro, decidimos que era hora de procurar um lugar para nos fixarmos, pois aquela vida de cigano ficava bem para um casal, mas o nosso filho estava crescendo e precisava de um “porto seguro”. Ele teria que estudar, criar raízes e não dava para fazer isso mudando quase todos os anos.
O anúncio nos jornais, quase sempre eram “uma furada” e eu começava a achar que seria muito difícil encontrarmos o tal El dourado. Até que em um dia chuvoso saímos para visitar um cliente de ponta de linha e nos deparamos com as bandeirinhas do loteamento.
Como eu disse, chovia muito e resolvemos não entrar. Porém o destino já havia traçado os nossos caminhos em direção ao local e não tinha mais como desviar.
Na semana seguinte, quando fomos fazer a visita ao mesmo cliente, estava sol e resolvemos visitar o loteamento. No dia seguinte estávamos comprando o último lote à venda e nos tornamos felizes proprietários de um terreno em um condomínio fechado e com clube privativo. Pelo menos era o que dizia o contrato.
A base da casa foi erguida em 60 dias. Mas estava apenas no embrião e ainda faltava muito para se tornar um lugar decente, mas mudamos mesmo assim, pois não dava mais para ficar pagando aluguel para viver em meio a tanta violência.
A casa, como a maioria não tinha muros, então a primeira coisa que me aconteceu foi uma vaca invadir o meu quintal para se alimentar.
Aliás, a cena que me pareceu pitoresca à princípio acabou se tornando mais um problema local.
As obras no condomínio ainda continuaram por uns tempos, mas logo pararam e o que era para ser um condomínio se tornou um matomínio!
Começaram as reuniões, os mutirões e as tentativas de fazer amizades e de nos reunimos em torno de um ideal em comum. Pelo menos era isso que os espertos que assumiam a liderança tentavam nos convencer, mas a verdade é que muito pouco foi feito e muito dinheiro foi gasto.
Sou pavio curto, admito. A minha tolerância é zero para quem quer dar uma de esperto e menos um para quem fala besteiras. No final acabei me isolando das pessoas a um ponto que não sei nem o nome do meu vizinho da frente.
Conto nos dedos as pessoas com quem converso, uma vez por mês, admito. Não me envolvo mais em polêmicas e não dou crédito a vagabundo que quer se dar bem às custa da boa fé dos outros.
As pessoas são de certa forma indiferentes para mim.
Admito que se passar por qualquer pessoa aqui dentro do condomínio, falo bom dia ou boa tarde, mas nem sei quem é. Não julgo ninguém, não acho que são boas ou ruins, não sei onde moram e nem o que fazem. Sou egoísta e me preocupo apenas com a minha vida e o meu mundo. Não me interessa se fulano trocou de carro, se pediu pizza ou se pagou a portaria. Também não me importa mais se vão ou não terminar o condomínio, se é realmente um condomínio ou se não é.
Hoje, nesse momento, meu mundo se resume a um cômodo 5x4, 5.
Nem mesmo sei mais se as minhas árvores estão produzindo frutos ou não. Estou preocupada comigo e com mais ninguém.
Não tenho e não quero ter vida social e, para falar a verdade, até me incomoda quando, por mero acaso, recebo visitas. Tenho meus problemas e não quero mais saber de nada além do meu umbigo.
Tentar lutar pelo bem comum me fez esquecer que EU tinha problemas e me deixou meio estática para resolvê-los. Sempre tinha alguém precisando de mais ajuda do que eu. Todos tinham que se preocuparem uns com os outros.
Só que percebi que essa comoção toda servia muito bem enquanto eu estava servindo aos outros, pois o mesmo não valia para mim. Aprendi a dizer não e a não acreditar em amizades. Amigo é muito bom, quando você cede o ombro para ele chorar. Passei a procurar sozinha os meus caminhos e a resolvê-los conforme a minha disposição e disponibilidade.
Não me importa mais o que as pessoas pensam, imaginam ou esperam de mim.
Mas não tem como negar que as pessoas aqui também te deixam em paz. Eu não tenho um vizinho ouvindo pagode alto no domingo ou uma igreja evangélica com o som super alto tentando te evangelizar. Não tem nem sequer testemunha de Jeová no domingo de manhã.
Onde moro não tem barulho de criança brincando, ônibus passando, trânsito de automóveis, nada. A gente se sente só algumas vezes, mas a tranqüilidade e a beleza da natureza superam qualquer sentimento de solidão.
Nada me incomoda nesse lugar, apenas a impossibilidade de crescer com ser humano.
“E deixem que digam, que pensem, que falem”.
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