No início dessa semana, funcionários de Supervia (empresa de trens que opera no Rio de Janeiro) entraram em greve por mais segurança, melhores condições de trabalho e aumento de salário.
Nada de mais, já que a greve é um direito do trabalhador brasileiro, se não fosse o fato de não estarem cumprindo a lei que garante que serviços essenciais terão que funcionar, pelo menos 60%, mesmo em greve.
Como os ferroviários não cumpriram a lei e os trens, que já andam lotados em horário de movimento, ficaram ainda mais cheios na manhã dessa quarta-feira, 15 de abril de 2009. Para resolver o problema da superlotação dos trens, que trafegavam com as portas abertas, alguns funcionários, revoltadinhos porque estavam trabalhando enquanto outros estavam em greve, resolveram espancar os passageiros do trem.
Eu vi e analisei a cena um milhão de vezes até ter uma opinião formada sobre o assunto e assim poder transmiti-la.
Então, vamos analisar os fatos:
- O trabalhador da Supervia é assalariado, levanta mais cedo do que os demais, pois dele dependem os demais trabalhadores para chegar no horário;
- Está em greve por maior segurança e condições melhores de trabalho, portanto, não está podendo se considerar melhor que nenhum trabalhador;
- Sendo um serviço essencial, deveria ter mantido pelo menos 60% de seus funcionários trabalhando para que o trabalhador comum que necessita do serviço não seja prejudicado e não o fez;
- Aqueles funcionários que agrediram a população não me pareciam pertencer à diretoria da empresa, portanto, estavam defendendo os direito de quem?
Após analisar todos esses fatos, um desânimo se abateu sobre mim, pois, enfim, cheguei à conclusão de que o nosso país nunca vai mudar, nunca será um lugar em que a crise será coisa do passado, pois enquanto as pessoas que vivem na mesma situação continuarem a se agredirem ao invés de darem as mãos, não teremos força política para mudar o país.
O trem está lotado? Instrua o passageiro para aguardar o próximo ou se afastar da faixa amarela para que este possa entrar em movimento.
O que será que os funcionários demitidos da empresa vão achar quando estiverem pegando um trem superlotado para chegar na hora no próximo emprego e forem empurrados para dentro?
Será que todos aqueles funcionários nunca tiveram que pegar um trem lotado para ir para o trabalho?
Eu posso dizer que peguei o trem apenas 1 vez na minha vida e fiquei impressionada com a destreza e a educação dos funcionários que me pareceram solícitos com a marinheira de primeira viagem, apesar de ter ouvido o contrário a minha vida toda.
Quatro funcionários mancharam a imagem da empresa que levou anos para ser modificada.
Realmente, o trem era um lugar imundo, onde as pessoas se apertavam, tinha batedores de carteiras, mendigos, assaltantes, maconheiros... Essa era a imagem da viagem do trem que sempre tivemos a nossa vida inteira.
Apesar das linhas de trens terem sido entregues por uma bagatela para a Supervia explorar, temos que entender que a viação férrea no Rio de Janeiro estava mais que sucateada, estava abandonada!
Eu quero que o leitor entenda que não sou funcionária da empresa, ninguém está me pagando para escrever sobre isso, mas eu tenho que dizer que a minha viagem de trem foi até muito tranqüila e, na medida do possível, confortável.
Quando eu vi aqueles quatro elementos chicoteando os passageiros do trem eu me lembrei dos soldados que vão para as guerras lutar por um ideal que não é o seu.
Mas nem isso se compara ao que os quatro maus elementos fizeram, pois eles já estavam reivindicando legalmente os seus direitos, já estavam na suas próprias batalhas, agora por quê fizeram um absurdo como esse?
Passageiros reclamam de trens lotados, trabalhadores da Supervia reclamam que precisa haver mais composições em horário de pico, então qual era a batalha em que esses quatro lutavam?
Quem diz que as composições são suficientes são os diretores da empresa, que chegam para trabalhar em seus carros importados, com ar refrigerado e motoristas.
Será que esses quatro chegam no trabalho de helicóptero?
Tem vândalo, tem marginal? Lógico que tem.
A própria empresa admitiu que prendeu mais de 200 pessoas só esse ano, mas o que aquele policial que acompanhou tudo de perto deveria ter feito? Ter dado ordem de prisão imediatamente aos quatro elementos.
No momento em que aquelas cenas eu me senti como gado caminhando para o abate!
Na quarta-feira a Supervia disse que os funcionários foram demitidos, na quinta-feira tentou justificar o fato dizendo que vândalos impediam o fechamento das portas dos trens (quando na verdade era o empurra, empurra de gente querendo entrar e sair ao mesmo tempo) e que os funcionários eram terceirizados, na sexta-feira colocou um pedido de desculpas nos alto falantes das estações.
Depois de tudo que eu vi, as desculpas foram aceitas, já que não era a empresa que deveria sentir vergonha do que aconteceu e sim a população que está se canibalizando a troco de nada.
Essa imagem tem que ficar para sempre, não na memória da empresa e sim na memória do povo que deve aprender como não se deve tratar os seus semelhantes.
Realmente eu hoje me encontro estarrecida, sem esperanças. Estou me sentindo mais humilhada do que aqueles que foram agredidos naquele trem.
E vocês sabem por quê?
Porque não foram filhinhos de papai que agrediram trabalhadores, não foram deputados que roubaram a merenda do colégio.
Foi porque eu vi o meu povo agredindo o meu povo.